Sorrimos porque estamos alegres ou estamos alegres porque sorrimos? Como William James entendia as emoções

Filosofia na Escola
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Você já se perguntou por que sorrimos? É porque estamos alegres ou porque o simples ato de sorrir nos deixa alegres? A resposta mais comum seria: sorrimos porque sentimos alegria. Parece óbvio, não é? Mas e se for o contrário? Será que o corpo pode ser capaz de "enganar" a mente, fazendo com que a emoção surja a partir de um gesto ou movimento?

Essa pergunta não é nova. No final do século XIX, o filósofo e psicólogo William James propôs uma ideia surpreendente: talvez as emoções não sejam apenas algo que sentimos internamente antes de expressarmos no corpo, mas, sim, algo que pode nascer diretamente de nossas ações físicas. Por exemplo, se começarmos a sorrir agora, mesmo sem um motivo aparente, será que poderíamos começar a nos sentir mais felizes? Ou se adotarmos uma postura de tensão, será que isso nos faria sentir mais nervosos ou estressados?

A ideia de William James

No senso comum, imaginamos que as emoções surgem primeiro na mente e depois se refletem no corpo. Por exemplo, ao ver algo assustador, sentimos medo e só então nosso corpo reage: o coração acelera, suamos e talvez comecemos a correr. Essa forma de pensar parece tão natural que raramente a questionamos.

Mas William James, no final do século XIX, propôs algo diferente. Para ele, a relação entre corpo e mente não era uma via de mão única, em que a mente manda e o corpo obedece. James sugeriu que muitas vezes o corpo pode "tomar a frente" no processo emocional, influenciando a forma como nos sentimos. Ele dizia que as emoções não acontecem primeiro na mente para depois serem sentidas no corpo, mas que a própria ação do corpo pode ser a origem do sentimento.

Imagine, por exemplo, que você está caminhando por uma trilha e se depara com um urso. A reação automática seria correr. Segundo James, não é o medo que causa a corrida, mas o ato de correr que reforça e amplifica o medo. Ele descreveu o corpo como uma espécie de “caixa de ressonância” para as emoções, em que cada movimento ou gesto amplifica o estado emocional.

Nas suas palavras

Todo mundo sabe como o pânico é induzido pela fuga e como ceder aos sintomas do luto aumenta essas próprias paixões. Cada acesso de soluço torna a tristeza mais aguda e provoca outro acesso ainda mais forte, até que finalmente o repouso resulta apenas com lassidão e com o aparente esgotamento da maquinaria.

O experimento de Paul Ekman

Será que isso é verdade? A teoria de James ganhou suporte experimental no século XX. O antropólogo Paul Ekman, conhecido por seus estudos sobre expressões faciais, fez uma descoberta surpreendente enquanto desenvolvia um método para medir os movimentos dos músculos faciais. Ele e seu colega Wallace Friesen estavam analisando como certos músculos se contraem para formar expressões típicas de emoções, como tristeza, alegria ou raiva. Durante os testes, eles perceberam algo curioso: ao contrair os músculos associados a essas expressões, começaram a sentir as emoções correspondentes de forma intensa.

Intrigados, Ekman e Friesen decidiram investigar mais a fundo. Eles realizaram um experimento no qual os participantes recebiam instruções precisas para contrair determinados músculos faciais, criando configurações típicas de emoções, como um sorriso ou uma expressão de raiva. Os pesquisadores, no entanto, não explicaram aos participantes que essas configurações estavam relacionadas a emoções. Depois de formarem as expressões faciais, os participantes foram questionados sobre como se sentiam.

Os resultados foram surpreendentes: quase todos os participantes relataram sentir emoções que correspondiam às expressões faciais que haviam adotado, mesmo sem saber que estavam imitando expressões de alegria, tristeza ou raiva. Por exemplo, aqueles que tinham formado um sorriso relataram sensações de felicidade, enquanto aqueles que fizeram expressões de raiva se sentiram irritados ou tensos.

Esse experimento reforça a ideia de que o corpo não é apenas um reflexo das emoções, mas pode desempenhar um papel ativo na sua criação. Ele também mostra como as expressões faciais, tão sutis e automáticas, têm o poder de influenciar profundamente nosso estado emocional. Assim como sugerido por William James, o ato de sorrir pode não ser apenas uma consequência da alegria, mas também sua causa.

Como podemos usar esse conhecimento a nosso favor?

Se o corpo influencia a mente tanto quanto a mente influencia o corpo, então podemos usar conscientemente essa relação a nosso favor. Em vez de esperar que as emoções desejadas surjam espontaneamente, podemos adotar comportamentos que as incentivem. Essa ideia foi defendida pelo próprio William James, que sugeriu que, para superar tendências emocionais indesejáveis, devemos “ir friamente, mas com determinação, através dos movimentos exteriores das disposições contrárias que preferimos cultivar.”

O que isso significa, na prática? Imagine que você está em um dia difícil, sentindo-se desanimado ou ansioso. Segundo James, uma estratégia eficaz seria adotar deliberadamente posturas e ações associadas a estados emocionais mais positivos. Por exemplo, “suavizar a testa, iluminar o olhar, contrair a parte dorsal do corpo em vez da ventral, falar em um tom mais animado e dar um elogio cordial.” Essas ações podem parecer artificiais no início, mas, ao longo do tempo, têm o poder de "descongelar" até mesmo o coração mais frio e trazer à tona sentimentos mais leves e agradáveis.

Experimentos modernos, como os de Paul Ekman, reforçam que mudanças sutis no comportamento, como um simples sorriso, podem desencadear emoções positivas. Esse conhecimento pode ser aplicado em diversas situações: quando estamos nervosos antes de uma apresentação, por exemplo, adotar uma postura confiante e um tom de voz firme pode ajudar a reduzir o nervosismo e nos fazer sentir mais preparados.

Em última análise, a ideia de James nos lembra que não somos reféns das nossas emoções. Ao aprender a manipular os “movimentos exteriores” — nossos gestos, expressões e comportamentos —, podemos exercer um certo controle sobre nossos estados internos. 

Referência

EVANS, Dylan. Emotion: A Very Short Introduction. Oxford: Oxford University Press, 2001.