“Os poemas homéricos têm por fundamento uma visão de mundo clara e coerente. Manifestam-na quase a cada verso, pois colocam em relação com ela tudo quanto cantam de importante – é, antes de mais nada, a partir dessa relação que se define seu caráter particular. Nós chamamos de religiosa essa cosmovisão, embora ela se distancie muito da religião de outros povos e tempos. Essa cosmovisão da poesia homérica é clara e coerente. Em parte alguma ela enuncia fórmulas conceituais à maneira de um dogma; antes se exprime vivamente em tudo que sucede, em tudo que é dito e pensado. E embora no pormenor muitas coisas resultem ambíguas, em termos amplos e no essencial, os testemunhos não se contradizem. É possível, com rigoroso método, reuni-los, ordená-los, fazer lhes o cômputo, e assim eles nos dão respostas explícitas às questões sobre a vida e a morte, o homem e Deus, a liberdade e o destino (…).” (OTTO. Os deuses da Grécia: a imagem do divino na visão do espírito grego. 1ª Ed., trad. [e prefácio] de Ordep Serra. – São Paulo: Odysseus Editora, 2005 – p. 11.)
Com base no texto, e em seus conhecimentos sobre a função dos mitos na Grécia arcaica, assinale a alternativa correta.
Os mitos homéricos serviram de base para a educação, formação e visão de mundo que o homem grego arcaico possuía. Em seus cânticos, Homero justapõe conceitos importantes como harmonia, proporção e questionamentos a respeito dos princípios, das causas e do porquê das coisas. Embora todas essas instâncias apresentavam-se como tal, os mitos não deixaram de lado o caráter mágico, fictício e fabular em que eram narrados.
O mito já era pensamento. Ao formalizar os versos de sua poesia, Homero inaugura uma modalidade literária bem singular no ocidente. As ações dos deuses e dos homens, por exemplo, sempre obedeceram a uma ordem pré-estabelecida, a qual sempre revelou uma lógica racional em funcionamento.
Os mitos tiveram função meramente ilustrativa na educação do homem grego, pois o caráter teórico e abstrato da cultura grega apagou em grande parte os aspectos que se revelariam relevantes na poesia grega.
De acordo com os poemas homéricos, os deuses em nada poderiam interferir no destino dos humanos e, assim, a determinação divina (ananque) se colocava em segundo plano, uma vez que era o acaso (tykhe) quem governava, isto é, possuía a função de ensinar ao homem o que este deveria escolher no momento de sua livre ação.
As poesias de Homero sempre mantiveram a função de educar o homem grego para o pleno exercício da atividade racional que surgiria no século VI a.C., uma vez que, de acordo com historiadores e helenistas, não houve uma ruptura na passagem do mito para o logos, mas sim um processo gradual e contínuo de enraizamento histórico que culminou no advento da filosofia.
“Dividiu-se em três partes o Universo, e cada qual logrou sua dignidade. Coube-me habitar o mar alvacento, quando se tiraram as sortes, a Hades couberam as brumosas trevas e coube a Zeus o vasto Céu, no éter, e as nuvens. A terra ainda é comum a todos, assim como o vasto Olimpo”
Segundo o texto de Homero, a origem do Universo é explicada pela divisão feita por Cronos entre seus três filhos: Poseidon, Hades e Zeus. A visão mítica revelada por relatos como esse permeou as sociedades gregas e romanas da Antiguidade e atribuiu um caráter religioso a seu legado artístico e cultural. As religiões e as mitologias são formas de explicar os mistérios do mundo que tiveram grande importância para a formação dos povos da Antiguidade. A mitologia grega, por exemplo, criou narrativas sobre a natureza, os sentimentos humanos presentes no imaginário do mundo ocidental. Dessa perspectiva, analise os enunciados a seguir:
I. O mito de Prometeu continua sendo lembrado na atualidade, representando a possibilidade do ser humano de desafiar os deuses e construir a cultura.
II. O mito de Édipo tem relação com a ideia de destino e com a dificuldade dos seres humanos diante das dificuldades da vida.
III. Os deuses gregos eram poderosos e imortais, não tinham as fraquezas humanas e dominavam o mundo com sua astúcia.
IV. Muitas obras da literatura grega se inspiraram nas histórias vividas pelos mitos, com destaque especial para as obras de Homero.
V. A mitologia grega se desenvolveu sem vínculos com a religião da época; os mitos e os deuses eram cultuados de forma totalmente independente.
Assinale a alternativa correta:
apenas V é falsa.
todas são verdadeiras.
I, II, III são verdadeiras; IV e V são falsas.
todas são falsas.
apenas I é verdadeira.
Texto 1
Eis aqui, portanto, o princípio de quando se decidiu fazer o homem, e quando se buscou o que devia entrar na carne do homem.
Havia alimentos de todos os tipos. Os animais ensinaram o caminho. E moendo então as espigas amarelas e as espigas brancas, Ixmucaná fez nove bebidas, e destas provieram a força do homem. Isto fizeram os progenitores, Tepeu e Gucumatz, assim chamados.
A seguir decidiram sobre a criação e formação de nossa primeira mãe e pai. De milho amarelo e de milho branco foi feita sua carne; de massa de milho foram feitos seus braços e as pernas do homem. Unicamente massa de milho entrou na carne de nossos pais. (Adaptado: SUESS, P. Popol Vuh: Mito dos Quiché da Guatemala sobre sua origem do milho e a criação do mundo. In: A conquista espiritual da América 0Espanhola: 200 documentos – Século XVI. Petrópolis: Vozes, 1992, p. 32-33.) Texto 2
“Se você é o que você come, e consome comida industrializada, você é milho”, escreveu Michael Pollan no livro O Dilema do Onívoro, lançado este ano no Brasil. Ele estima que 25% da comida industrializada nos EUA contenha milho de alguma forma: do refrigerante, passando pelo Ketchup, até as batatas fritas de uma importante cadeia de fast food – isso se não contarmos vacas e galinhas que são alimentadas quase exclusivamente com o grão.
O milho foi escolhido como bola da vez ao seu baixo preço no mercado e também porque os EUA produzem mais da metade do milho distribuído no mundo. (Adaptado: BURGOS, P. Show do milhão: milho na comida agora vira combustível.Super Interessante. Edição 247, 15 dez. 2007, p.33.)
Com base nos textos 1 e 2 e nos conhecimentos sobre as relações entre organização social e mito, é correto afirmar.
Os deuses maias criaram os homens dotados de livre arbítrio para, a partir dos princípios da razão e da liberdade, ordenarem igualitariamente a sociedade.
Para certas tradições de pensamento, como a da escola de Frankfurt, o iluminismo representa a superação completa do mito.
Na busca de um princípio fundante e ordenador de todas as coisas, como ocorre na mitologia grega, a narrativa mítica justifica as bases da legitimação de organização política e de coesão social.
A exemplo das narrativas que predominavam no período homérico da Grécia antiga, os mitos expressam uma forma de conhecimento científico da realidade.
Assim como nos povos Quiché da Guatemala, também os mitos gregos procuram explicar a arché, a origem, a partir de um elemento originário onde está presente o milho.
O mito é parte integrante da história da humanidade.
“Cada indivíduo deve encontrar um aspecto do mito que se relacione com sua própria vida. Os mitos têm basicamente quatro funções. A primeira é a função mística – e é disso que venho falando, dando conta da maravilha que é o universo, da maravilha que é você, e vivenciando o espanto diante do mistério. Os mitos abrem o mundo para a dimensão do mistério, para a consciência do mistério que subjaz a todas as formas. Se isso lhe escapar, você não terá uma mitologia. Se o mistério se manifestar através de todas as coisas, o universo se tornará, por assim dizer, uma pintura sagrada. Você está sempre se dirigindo ao mistério transcendente, através das circunstâncias da sua vida verdadeira. A segunda é a dimensão cosmológica, a dimensão da qual a ciência se ocupa, mostrando qual é a forma do universo, mas fazendo-o de uma tal maneira que o mistério, outra vez, se manifeste. Hoje, tendemos a pensar que os cientistas detêm todas as respostas. Mas os maiores entre eles dizem-nos: “Não, não temos todas as respostas. Podemos dizer-lhe como a coisa funciona, mas não o que é”. Você risca um fósforo. O que é o fogo? Você pode falar de oxidação, mas isso não me dirá nada. A terceira função é sociológica – suporte e validação de determinada ordem social. E aqui os mitos variam tremendamente, de lugar para lugar. Você tem toda uma mitologia da poligamia, toda mitologia da monogamia. Ambas satisfatórias. Depende de onde você estiver. Foi essa função sociológica do mito que assumiu a direção do nosso mundo – e está desatualizada. A quarta função do mito, aquela, segundo penso, com que todas as pessoas deviam tentar se relacionar – a função pedagógica, como viver uma vida humana sob qualquer circunstância. Os mitos podem ensinar-nos isso.” (CAMPBELL, J. O Poder do Mito. São Paulo: Palas Athenas, 1990. P. 32).
Podemos afirmar que
não necessitamos dos mitos e que eles são ultrapassados.
o mito é uma experiência singular que continua dando sentido à existência humana.
os mitos pertencem somente a comunidades pouco evoluídas.
o mito morreu e não diz mais nada para a sociedade.
Para a mitologia grega […] “Zeus ocupa o trono do universo. Agora o mundo está ordenado. Alguns deuses disputaram entre si, alguns triunfaram. Tudo que havia de ruim no céu etéreo foi expulso, ou para a prisão do tártaro ou para a terra, entre os mortais. E os homens, o que aconteceu com eles? Quem são eles?” VERNANT, Jean Pierre. O universo, os deuses, os homens. São Paulo: Companhia das Letras, 2000 A ordem, em todas as suas acepções, é o grande objeto do espanto filosófico. Causam maravilhamento a ordem das leis naturais que a ciência descobre, a ordem manifesta nas proporções e harmonias da obra de arte e a ordem das ações justas na vida moral e política da sociedade. Antes da filosofia, os mitos já expressavam esse maravilhamento, porém com diferenças importantes.
Sobre esse assunto, é correto afirmar que o mito:
Possui uma grande densidade teológico-moral, dando a cada membro do grupo autonomia para decidir e atuar sem limites objetivos.
Estabelece parâmetros de abordagem dos fenômenos naturais sobre bases estritamente lógicas, como o princípio de não contradição.
Enuncia de modo argumentativo a escala de valores de uma sociedade pré-crítica.
Busca explicações suficientes sobre o lugar do homem no mundo, apelando ao sagrado.
“(…) Assim, a magia e a mitologia ocupam a imensa região exterior do desconhecido, englobando o pequeno campo do conhecimento concreto comum. O sobrenatural está em todas as partes, dentro ou além do natural; e o conhecimento do sobrenatural que o homem acredita possuir, não sendo da experiência direta comum, parece ser um conhecimento de ordem diferente e superior. É uma revelação acessível apenas ao homem inspirado ou (como diziam os gregos) ‘divino’ — o mágico e o sacerdote, o poeta e o vidente”. CORNFORD, F.M. Antes e Depois de Sócrates. Trad. Valter Lellis Siqueira. São Paulo: Martins Fontes, 2001, pp.14-15.
A partir do texto acima, é correto afirmar que
o mito não distingue o plano natural do sobrenatural, sendo o conhecimento do sobrenatural superior.
o campo do conhecimento mítico limita-se ao que se manifesta no campo concreto comum.
o conhecimento no mito, por ser uma revelação, é acessível igualmente a todos os homens.
a magia e a mitologia não se confundem com o conhecimento concreto comum.
“O mito é uma narrativa. É um discurso, uma fala. É uma forma de as sociedades espelharem suas contradições, exprimirem seus paradoxos, dúvidas e inquietações. Pode ser visto como uma possibilidade de se refletir sobre a existência, o cosmos, as situações de ‘estar no mundo’ ou as relações sociais”. Everado Rocha.
Mediante essa definição geral de mito é correto afirmar que
alguns mitos oferecem modelos de vida e podem servir como referências para a vida de muitas pessoas mesmo no século XXI.
Platão, um dos filósofos mais estudados e influentes do pensamento ocidental, não recorria aos mitos em seus diálogos, apesar de ter sido o primeiro a utilizar o termo mitologia.
todas as afirmações acima estão corretas.
as sociedades com conhecimentos científico, tecnológico e filosófico complexamente constituídos não possuem mitos, pois eliminaram as duvidas e os paradoxos.
as sociedades antigas, ocidentais e orientais, foram fundadas sobre o mesmo mito primitivo, variando, apenas, os nomes de seus personagens.
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