Pirro de Élida
Pirro nasceu na cidade de Élida em torno de 360 a.C. e inicialmente se dedicou à pintura, no que não foi bem-sucedido. Parece ter se voltado para a filosofia depois que fez uma viagem ao Oriente em uma expedição de Alexandre. Na Índia, conheceu os gimnosofistas, sábios indianos. Numa demonstração de coerência inacreditável, um desses sábios se jogou voluntariamente em uma fogueira e suportou impassível a dor enquanto as chamas devoravam seu corpo.
Ao retornar para sua cidade natal, passou a se dedicar à filosofia com a qual atraiu bastante atenção. O respeito que conquistou por seu modo de vida e comportamento fez com que fosse apontado como sacerdote e que os filósofos não precisassem pagar impostos. Nesse aspecto, Pirro se destacava pela sua tranquilidade e capacidade de não se deixar afetar pelo que ocorria a sua volta. De fato, sua capacidade de se manter calmo nas situações mais adversas era extraordinária.
Há uma história segundo a qual durante uma tempestade em alto mar o barco que Pirro era balançado por ventos violentos e era jogado de um lado para o outro pelas ondas enormes. Toda a tripulação estava apavorada com o risco da morte e ainda assim o filósofo permanecia indiferente ao perigo. Olhando para um porco que comia calmamente na tempestade, apontava no animal um exemplo de comportamento sábio.
As histórias sobre Pirro são abundantes. Algumas servem para compreendermos alguns conceitos de sua filosofia, outras foram criadas por críticos para ridicularizar suas ideias. De qualquer forma, é importante sempre manter um certo ceticismo em relação às duas.
Uma segunda anedota conhecida sobre sua tranquilidade e indiferença é um episódio envolvendo seu amigo Anáxarcos. Este havia caído em um pântano e não conseguia sair. Gritava pela ajuda de pessoas que passavam próximas ao local. Num determinado momento, vê Pirro passando, olhando em sua direção mas seguindo em frente sem fazer nada para ajudá-lo. Apesar disso, elogia o amigo pela indiferença.
Diante de uma pessoa tão pitoresca, é natural se perguntar o que pensava para viver dessa forma. E a resposta é: Pirro era um cético.
O ceticismo de Pirro
Pirro é o pai de uma filosofia chamada de ceticismo. A questão central desse filósofo é o que podemos conhecer com certeza? Algumas pessoas estão certas de possuírem uma alma, enquanto outras alimentam dúvidas sobre sua existência. No entanto, praticamente ninguém duvidaria que em inúmeras situações podemos ter certeza. Por exemplo, imagine que você está a poucos metros de um cão que se mostra numa posição de ataque. Ele mostra os dentes e começa a correr em sua direção. Numa situação como essa, você certamente não ficaria parado, calmo, pensando que a existência do cão é incerta, pois pode ser uma ilusão criada pelos seus olhos.
Pirro ao contrário, acreditava que não podemos ter certeza de absolutamente nada. Nem mesmo de que existe um cão feroz na sua frente.
O filósofo pensava que existiam três perguntas fundamentais:
- Como as coisas realmente são?
- Que atitude deveríamos adotar em relação à elas?
- O que acontecerá com aqueles que adotarem essa atitude?
A primeira dessas questões, Pirro respondia que não como podemos saber como as coisas realmente, apenas como elas nos parecem. A mesma coisa parece diferente para pessoas diferentes, e, portanto, é impossível saber qual opinião é correta. A diversidade de opinião entre os sábios, bem como entre as pessoas comuns, prova isso. Para cada afirmação, a afirmação contraditória pode ser oposta com igualmente bons fundamentos, e qualquer que seja a minha opinião, a opinião contrária é acreditada por alguém que é tão inteligente e competente para julgar como eu. Opinião podemos ter, mas certeza e conhecimento são impossíveis.
Com relação à segunda questão, o filósofo acreditava que deveríamos suspender o juízo em relação a tudo. Normalmente, pensamos que uma ação é boa ou ruim, justa ou injusta, prejudicial ou benéfica. Pense no episódio da tempestade: quantos julgamentos faríamos numa situação assim? Mesmo sem querer, pensamos que o barco irá afundar, que se afundar iremos morrer, que a morte é pior que a vida, por isso é melhor continuar vivendo etc. Todos esses julgamentos, pensava Pirro, são precipitados, pois não podemos saber realmente tudo isso. O mais correto, então, seria evitar julgar.
Por fim, aqueles que adotam a atitude adequada em relação à todas as coisas, ou seja, a suspensão do juízo, terão como recompensa uma grande tranquilidade que surge da indiferença, do não-julgamento. Era esse o segredo da tranquilidade de Pirro. Era capaz de se manter calmo em qualquer situação porque evitava fazer julgamento sobre tudo.
Referências
Giovanni Reale. História da Filosofia: Antiguidade e Idade Média. São Paulo: Paulus Editora, 1990, pp. 267-270.