Por que não se masturba no pátio do colégio?
Sim, por que não? Pois a técnica é simples, os resultados imediatos e todo mundo, sem exceção, já provou, prova ou provará desses prazeres solitários. Então, por que recai sobre essa técnica tão velha como o mundo e os homens uma tal carga de culpa? Como justificar o arsenal repressivo que envolve a masturbação? De fato, não deveríamos nos preocupar de modo algum, já que não é possível imaginar qualquer possibilidade de um conflito, um desacordo ou mal entendido entre o produtor e o consumidor.
O prazer ao alcance da mão
Onã é considerado o inventor da prática – pelo menos se acreditarmos no que nos diz a Bíblia (Gênesis 138, 9). Conta a história que uma vez Deus pediu para que Onã fizesse um filho com sua cunhada que havia enviuvado recentemente. A lei era essa na época: quando uma mulher perdia seu marido e não tinha filhos, o irmão do defunto cuidava dessa tarefa e gerava filhos que herdariam a fortuna do irmão falecido. Para não ter filhos com sua cunhada, Onã se masturbava antes de visitar a esposa que o aguardava. Deus, que não gosta muito que o enganem, menos ainda que não o obedeçam, pior, que se pense em si mesmo ao invés de na família e na linhagem, maldisse Onã. Para caracterizar o passatempo de Onã – o seu, o nosso, de seus pais, de seus professores…. – , desde então se fala de onanismo.
A psicanálise provou que a masturbação é algo natural. Os etólogos mostram que já no ventre materno as crianças praticam movimentos destinados a provocar prazer. Desde muito cedo, pois, e segundo a ordem da natureza, o ser humano se dá prazer na mais absoluta das inocências. Mais tarde, e na medida em que a criança cresce, o pais socializam sua prole e a coloca em conformidade com a ordem social. Se ensina então que a masturbação não é uma coisa boa, mais ou menos claramente, mais ou menos violentamente. Com uma relativa calma no melhor dos casos (pais afáveis e atentos) ou uma violência castradora no pior (pais agressivos e sem delicadeza). Todos fomos desviados culturalmente desse movimento natural pelos adultos, que condenaram essa prática ao gesto íntimo e secreto ou a uma prática culpável e perigosa, errônea e pecaminosa.
Porque a masturbação é natural e sua supressão cultural. A igreja imediatamente condena essa prática que a incomoda. O história de Onã, que ofende a Deus, é reutilizada segundo a necessidade dos séculos que passam: se associa o onanismo ao pecado que deve ser confessado e, depois, expiado; ele é comparado com a mentira, a dissimulação, a enfermidade, a perversão; se associa a uma negatividade prejudicial. Mais tarde a ciência assume, em especial os especialistas em higiene, que associam o prazer solitário com a desintegração do equilíbrio nervoso, físico e psíquico. Os sacerdotes ameaçavam os masturbadores com o inferno; os médicos, com a debilidade psicológica e mental: prometiam as piores enfermidades para os dedicados a este deleite.
Por qual razão a masturbação natural e reguladora de uma sexualidade que não encontra outras formas de expressão no momento presente passa a ser uma falta que devemos pagar ou uma prática desonrosa, inconfessável e inconfessada, ainda que cada um recorra a ela de vez em quando ou regularmente? Porque a civilização se constrói sobre a repressão das pulsões naturais, as desvia e utiliza para fins distintos da satisfação individual, para melhor proveito das atividades culturais da civilização. Um onanista é uma pessoa socialmente improdutiva, um solitário interessado em seu gozo, que não se preocupa em dar a sua pulsão uma forma socialmente reconhecida e aceitável, a saber, a genitalidade (ou seja, a relação sexual reduzida ao contato dos órgãos genitais) em uma história heterossexual (um homem com uma mulher), monógama (um parceiro, não dois), que não procura a família, o lar, a procriação.
Protegido pelo seguro social?
Alguns filósofos se opõe – se é que se pode dizer isso – a esse estado de coisas. São os cínicos gregos (Diógenes de Sínope, Crates ou Hiparquia, uma das escassas mulheres nessa atividade essencialmente masculina). Atuam, ensinam e professam em Atenas, Grécia, no século IV a.c. Seu modelo? O cachorro (cynós, em grego), porque late contra os poderosos, morde os importantes e não recorre a outra autoridade se não a natureza. Para os cínicos, a cultura consiste em imitar a natureza, em permanecer o mais perto desta possível. Por isso sua decisão de imitar o cachorro (ou outros animais pelos quais tem especial afeto: o rato, a rã, o peixe, o galo ou um arenque atado na ponta de uma corda…).
Diógenes não vê por qual razão se privar de algo que proporciona um bem e não prejudica o próximo, ou esconder o que cada um pratica na intimidade de sua casa. Se a natureza propõe, a cultura dispõe: por que deveríamos seguir sempre no sentido da repressão, da culpabilização? Por que não aceitar culturalmente a natureza e o que esta convida a fazer, já que não é preciso temer qualquer dano? Se temos sede ou fome, bebemos água da fonte ou arrancamos um fruto de uma árvore, sem que isso incomode ninguém… Por que quando sentimos um desejo sexual, que é tão natural como o desejo de beber ou comer, deveríamos recusar satisfazer ou nos escondermos para satisfazê-lo? Não há boas razões para o sofrimento culpável, para a vergonha dissimulada. O pudor é um valor falso, uma virtude hipócrita, uma mentira social que atormenta inutilmente o corpo produzindo mal estar.
A cultura serve quase sempre aos interesses da sociedade, já que necessita fazer da sexualidade um assunto coletivo, comunitário, geral. Porque, para a sociedade, a energia da libido não deve comprazer as individualidades livres que não desejam a criação da família, célula básica da sociedade. A masturbação é uma atividade não social, individual, antiprodutiva para o grupo. Fazer do prazer um assunto gratuito entre um e si mesmo, e não uma atividade remunerada para a cidade, assinala a apropriação, senão a reapropriação, de si por si, sem outra preocupação que sua satisfação egoísta. Daí que o masturbador seja um inimigo declarada das igrejas, dos Estados e das comunidades constituídas. Com seu gesto, se faz amigo de si mesmo e ignora as máquinas sociais consumidoras e devoradoras de energias individuais.
Agora, veja bem, a masturbação é um fator pessoal de equilíbrio quando uma sexualidade clássica e entre dois é impossível: em uma pensão, uma prisão, um hospital, um hospício, um quartel, um asilo, ali onde alguém não satisfaz, ou não suficientemente, sua sexualidade com uma terceira pessoa. O onanismo é a solução das crianças, dos adolescentes, dos velhos, dos prisioneiros, dos militares, das pessoas privadas de seu lugar ou de seus hábitos. Incumbe aos enfermos, os excluídos, os solteiros voluntários ou não, aos viúvos e viúvas, aos que tem o prazer sexual proibido porque a época os considera muito jovens, demasiado velhos, demasiado feios ou porque não respondem aos critérios do mercado social do prazer.
Serve também à pessoa que não alcança sua plenitude com as formas clássicas e tradicionais da sexualidade burguesa e ocidental. Habitualmente, a civilização se alimenta do mal estar desses indivíduos forçados a esta forma de sexualidade, alegre se é ocasional e escolhida, desesperadora se regular e sofrida. O Trabalho, a Família, a Pátria, a Empresa, a Sociedade, o Colégio se alimentam destas energias desperdiçadas, sublimadas: para a civilização, toda sexualidade deve perseguir as formas familiares e tradicionais ou compensar a ordem, a hierarquia, a produtividade, a competitividade, a consciência profissional etc.
Ao se masturbar em praça pública (depende agora de você animar o pátio de sua escola…), Diógenes mostra os poderosos desse mundo (Alexandre, por exemplo) e aos transeuntes anônimos que seu corpo, sua energia, sua sexualidade, seu prazer, não são vergonhosos, que os pertencem e que não tem porque alienar sua individualidade em uma história coletiva. O onanista é um solteiro social que dá a natureza um máximo de poder em sua vida e concede à cultura o estritamente necessário para uma vida sem tropeços e sem violência com os outros.
Texto traduzido do livro Antimanual de Filosofia. Onfray, Michel. Antimanual de Filosofia. Buenos Aires: EDAF, 2005, pp. 54-58.