Teoria do comando divino
Um dos exemplos clássicos da teoria do comando divino é a entrega dos Dez Mandamentos por Deus.
A teoria do comando divino sustenta que a moralidade de uma ação é determinada pela existência de um comando divino para realizá-la ou não. De acordo com esta teoria, as ações humanas só são moralmente corretas se forem ordenadas por Deus e só são moralmente incorretas se forem proibidas por Deus. Em última análise, é a ideia de que a moralidade, o certo e o errado, dependem da existência de um deus.
Um exemplo clássico dessa teoria é os Dez Mandamentos. Os Dez Mandamentos são uma série de regras morais que foram dadas por Deus a Moisés no Monte Sinai, segundo a tradição bíblica. Eles incluem regras como “não roubar”, “não matar”, “não cometer adultério” e “honrar seus pais”. Esses mandamentos são vistos como regras sagradas e inquestionáveis, cuja obediência é necessária para uma vida moral.
Essa concepção foi defendida por pensadores cristãos destacados, como Santo Agostinho, Tomás de Aquino e, mais recentemente, C.S. Lewis.
A teoria do comando divino é uma teoria metaética que oferece uma resposta para questões como: o que é certo e errado? Qual a origem das normas morais? Por que devemos fazer o certo e não o errado?
Será que essa é uma boa resposta para essas questões?
Pontos a favor da teoria do comando divino
A teoria do comando divino tem alguns pontos a seu favor.
Primeiro, ela garante objetividade para a moralidade. De acordo com essa perspectiva, as normas morais são dadas diretamente por um ser supremo e infalível, que é Deus. Isso significa que elas não são subjetivas ou baseadas nas opiniões humanas, que estão sempre mudando ao longo do tempo, entre indivíduos e diferentes sociedades. Ao contrário, são objetivas, universais e fixas.
Isso é uma grande vantagem, pois se as normas morais são objetivas e universais, teremos um motivo para guiar nossas ações por elas e explicar porque todos deveriam respeitá-las. O mesmo não ocorre se supormos que as normas morais são uma criação humana, subjetiva. Nesse caso, por que deveríamos levar a sério essas regras? Por que não simplesmente criar uma nova regra quando uma desagrada? Se quero roubar e acredito que estou certo em fazer isso, então isso é certo e ponto final. Não há base para argumentar que estou errado e não deveria fazer isso.
Um segundo ponto é como essa teoria responde à pergunta: por que fazer as coisas certas? De acordo com a visão teísta da moralidade, as pessoas que praticam o bem serão recompensadas e aquelas que fazem o mal serão punidas. No fim, a justiça prevalecerá e o bem triunfará sobre o mal. Mesmo que alguns espertinhos se deem bem agora, no final acabarão pagando pelo que fizeram de errado. Se a justiça humana muitas vezes falha, a divina é infalível.
Sendo assim, temos boas razões para agir de forma desinteressada, mesmo que isso prejudique nossos interesses de curto prazo. Se dou o dinheiro para uma pessoa necessitada e deixo de comprar algo que gosto, estou agindo de forma que será benéfica para mim no futuro.
Críticas à teoria do comando divino
A teoria do comando divino também tem vários problemas.
O primeiro problema é a falta de acordo sobre qual texto religioso ou autoridade deveria guiar nossas deliberações éticas: a Bíblia, o Alcorão, os ensinamentos dos Upanishads Hindus? Para vivermos juntos na mesma sociedade precisamos chegar a algumas normas éticas comuns. Mas como podemos fazer isso em nossa sociedade pluralista se não houver nenhum acordo sobre qual autoridade religiosa (se houver) deveria ser seguida?
Segundo, a teoria do comando divino torna as normas morais extremamente arbitrárias. No diálogo de Eutífron, de Platão, Sócrates levanta a questão: “Os deuses aprovam certas ações porque essas ações são boas, ou essas ações são boas porque os deuses as aprovam?” Esse questionamento ficou conhecido como dilema de Eutífron. A primeira alternativa é a resposta de Platão e a segunda é a teoria do comando divino.
Vamos analisar a segunda alternativa primeiro: se “bom” e “ruim” são simplesmente rótulos arbitrários que Deus atribui às ações baseadas em sua vontade soberana, então parece que Deus poderia ter declarado que ódio, adultério, roubo e assassinato são moralmente bons. Alguns filósofos aceitaram essa consequência. (Guilherme de Ockham, um filósofo cristão do século XIV, parece ter defendido essa conclusão problemática.) Por outro lado, a maioria dos filósofos achou esta conclusão abominável. O filósofo Gottfried Leibniz (1646–1716), no livro Discurso de Metafísica, explica por quê:
Ao dizer, portanto, que as coisas não são boas de acordo com qualquer padrão de bondade, mas simplesmente pela vontade de Deus, parece-me que se destrói, sem perceber, todo o amor de Deus e toda a sua glória; por que elogiá-lo pelo que ele fez, se ele seria igualmente louvável fazendo o contrário?
Em contraste, a alternativa que afirma que “Deus aprova certas ações porque elas são boas” sugere que Deus tem uma razão para aprovar certas ações – a razão de que elas são boas. Mas se assim for, então devemos ser capazes de avaliar a bondade (ou maldade) das próprias ações e aprovar ou desaprová-las pela mesma razão que Deus faz, o que implica que podemos ter uma concepção de ética que é independente de Deus.
Referência
Austin, Michael W. Divine Command Theory, s.d. Disponível em: <https://iep.utm.edu/divine-c/>. Acesso em: 03 de Abr. de 2019.