Negação do antecedente
A negação do antecedente é uma falácia formal que ocorre quando a segunda premissa de um silogismo nega o antecedente de uma premissa condicional. A linguagem é complexa, mas isso já vai ficar claro. Considere o exemplo abaixo:
Se Sofia está em Porto Alegre, então ela está no Rio Grande do Sul
Sofia não está em Porto Alegre.
Portanto, ela não está no Rio Grande do Sul.
Não é difícil perceber porque esse argumento é uma falácia. O fato de Sofia não estar na cidade gaúcha de Porto Alegre não é suficiente para concluir que ela não está no Rio Grande do Sul, pois há muitas outras cidades nesse estado nas quais ela poderia estar.
Também não é difícil entender por que ela é chamada de negação do antecedente. Note que a primeira premissa do argumento é uma condicional, pois afirma que “se Sofia está em Porto Alegre, então ela está no Rio Grande do Sul”. Toda afirmação que tem a estrutura “se-então” é chamada de condicional.
Uma afirmação condicional tem dois elementos. Um antecedente, que especifica uma condição (“se Sofia está em Porto Alegre”, por exemplo) e um consequente, que determina o que ocorrerá se a condição for satisfeita (“então ela está no Rio Grande do Sul”, por exemplo). O antecedente é precedido pelo “se” e o consequente pelo “então”.
Note que, no argumento acima, a segunda premissa nega (através do “não”) o antecedente na primeira premissa. Por isso essa falácia se chama negação do antecedente.
Forma lógica da negação do antecedente
A negação do antecedente é uma falácia formal. Isso quer dizer que o defeito nesse tipo de raciocínio se deve a um problema em sua estrutura e não em seu conteúdo.
Toda negação do antecedente tem a seguinte estrutura ou forma lógica:
Se P, então Q.
Não P.
Não Q.
“P” e “Q” são variáveis para qualquer afirmação, como “Sofia está em Porto Alegre” ou “não está no Rio Grande do Sul”.
Por se tratar de uma falácia formal, podemos substituir o conteúdo dessa “forma” por qualquer coisa que sempre será uma falácia. Veja um exemplo.
Se você fumar (P), irá morrer (Q).
Você não fumou (não-P).
Portanto, não irá morrer (não-Q).
Infelizmente a morte pode ocorrer de uma infinidade de maneiras diferentes. O fato de uma pessoa não ter fumado não é garantia de que não irá morrer. Portanto, o argumento é uma falácia já que a conclusão não pode ser inferida das premissas.
Você deve ter notado que essa falácia tem exatamente a mesma forma lógica da primeira que analisamos. É ela que caracteriza uma negação do antecedente. E sempre que encontrar essa estrutura em um argumento, não importa sobre o que esteja falando, sobre a morte, geografia, crescimento econômico, meio ambiente, em qualquer situação ela irá gerar uma falácia.
Por que a negação do antecedente parece um argumento válido?
A definição clássica de falácia é a de que se trata de um argumento que parece válido mas não é. A negação do antecedente é um bom exemplo disso. Com muita frequência ele se passa por uma forma válida de argumentação.
Isso se deve em parte ao fato de se parecer com a forma válida de um silogismo chamado modus tollens. Ambas as formas trabalham com estruturas condicionais, mas têm diferenças cruciais em como as premissas levam às conclusões. O modus tollens é uma forma lógica que permite uma conclusão verdadeira de premissas verdadeiras. Ele tem a seguinte estrutura:
Se P, então Q.
Não Q.
Portanto, não P.
Vamos aplicar isso a um exemplo concreto:
Se P, então Q.
Não P.
Portanto, não Q.
No modus tollens, negar o consequente de uma proposição condicional nos permite concluir logicamente que o antecedente também deve ser falso. Por exemplo, se dizemos “Se Sofia está em Porto Alegre, então ela está no Rio Grande do Sul”, e sabemos que Sofia não está no Rio Grande do Sul, podemos concluir validamente que ela não está em Porto Alegre. Esse raciocínio é válido porque, se o consequente (Q) for falso, o antecedente (P) também deve ser falso para que a proposição condicional seja verdadeira.
Por outro lado, a falácia de negar o antecedente tenta fazer uma conclusão semelhante, mas começa negando o antecedente. No entanto, o fato de o antecedente ser falso não nos dá informações suficientes para concluir que o consequente é falso. No exemplo de Sofia, o fato de ela não estar em Porto Alegre não implica que ela não esteja no Rio Grande do Sul, já que há outras cidades onde ela poderia estar.
Modus tollens | Negação do antecedente |
Se P, então Q | Se P, então Q |
Não Q | Não P |
Então não P | Então não P |
Assim, enquanto o modus tollens nos permite inferir a falsidade do antecedente ao negar o consequente, a negação do antecedente falha em fornecer uma conclusão válida, porque o antecedente não ser verdadeiro não elimina todas as outras possibilidades para o consequente. O modus tollens é uma forma de argumento confiável e válida porque a verdade das premissas garante a verdade da conclusão. Já a negação do antecedente é inválida porque a estrutura do argumento não assegura que a conclusão siga necessariamente das premissas.
Referência
WALTON, D. Lógica Informal: manual de argumentação crítica. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012.